Edilza Fernandes Nascimento
Sou
artesã e também ADS - Agente de Desenvolvimento Solidária, acompanho os grupos
que fazem parte da Rede Xique-Xique em Parnamirim. O nosso grupo “Me ensina a
fazer renda” tem um trabalho de artesanato tradicional do litoral que possui
raízes indígenas e mestras habilidosas na faixa de 50, 60 e até 80 anos de
idade. Sentimos uma dificuldade grande, porque os jovens, de hoje em dia, não
querem continuar essa tradição. Há um tempo estava quase acabando, começamos a
organizar as mulheres para fortalecer o grupo e procuramos ensinar nossa arte
para outras pessoas que se interessam.
Eu
conheci este trabalho quando eu me mudei para Pirangi do Norte, no litoral sul
de Natal, há 18 anos, e havia a necessidade de ter renda extra para manter
minha família. Estava passando por um processo de separação e precisava criar
os meus filhos. Achei muito bonito e me interessei, então procurei as artesãs e
comecei revendendo os produtos delas. Depois eu aprendi e ensinei a fazer novas
técnicas, passei a incorporar zíper e novos designers nas peças para ter um
escoamento bom. Formamos um grupo, porque antes o trabalho era só individual, e
contamos com o apoio da ONG Instituto Pium de Cultura, que nos ajudou nesse
pontapé inicial.
Hoje
o “Me ensina a fazer renda” compõe-se de 15 pessoas, a maioria mulheres. Alguns
de nós, mais ou menos seis pessoas, saem de 15 em 15 dias para fazer a colheita
dos materiais. Temos que entrar em uma lagoa funda, colher o junco, que é uma
vegetação nativa encontrada nas lagoas e que chega atingir de três a quatro
metros. Dependemos de chuva, porque as lagoas têm que estar cheias para uma boa
colheita. Na nossa região há mais de 30 lagoas, na cheia, já na estiagem a
gente tem que procurar as lagoas mais distantes.
Para
colher a gente senta em cima de uma boia ou naqueles pneus de caminhão, e entra
na lagoa. Dentro da água existe cobra e em algumas também tem jacaré. As mulheres é que são as mais corajosas,
quando alguma vê um bicho, se afasta para a outra margem, mas não deixa morrer
a arte. Geralmente nós fretamos um caminhãozinho e da colheita, que dura
praticamente o dia inteiro, recolhemos na faixa de quatro fardos.
Nós
fazemos os artesanatos e repassamos a renda para famílias inteiras que tiram o
sustento da palha. Outras pessoas não fazem deste trabalho a principal fonte de
sobrevivência e vendem só o junco para que outros façam as artes. Fazemos
bolsas, acessórios, decoração, tapetes. Tudo o que você imaginar é feito.
Há
uns cinco anos que eu descobri que fazia economia solidária e não sabia. Eu
quando entrei não tinha noção nenhuma do que era feminismo e agroecologia.
Quando eu comecei a participar das capacitações, comecei a me empoderar.
Percebi que podia participar e também levar outras mulheres a terem mais
conhecimento. A nossa participação ainda é muito fragilizada, algumas ainda
ficam muito presas às coisas de casa, precisamos dar mais credibilidade para
nós mesmas e tirar as barreiras.
Eu
falo com orgulho que criei meus filhos com essa fonte de renda e ensinei as
minhas filhas, meus bem-querer, a serem empreendedoras. Não compartilhamos com
essa escravidão do trabalho. Todas estudaram, fizeram curso, e também são
artesãs e representam a juventude no nosso território. Eu sou apenas uma
formiguinha dentro do meu grupo, mas como formiguinha eu posso multiplicar os
conhecimentos e saberes que aprendo e me perceber como cidadã.
A dona Edilza conta uma das aventuras que viveu na colheita do junco. Ouça o áudio:
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